quinta-feira, 25 de maio de 2017

Que país é esse?

Nos últimos anos, o Brasil tem visto um recrudescimento do Estado policial. Exemplos nítidos desse período são as muitas gravações ilegais, quase sempre seguidas de vazamentos seletivos através da imprensa.

Para algumas autoridades, a Constituição Federal perdeu seu poder normativo e não passa de um "livrinho". Ninguém melhor que o cartunista Laerte para retratar essa situação:

Charge publicada na Folha de S.Paulo de 23/5

A mídia, muitas vezes silente, noutras conivente, aos poucos vai se dando conta do que acontece. Esta semana, diante da divulgação indevida de ligações telefônicas entre conhecido repórter da Veja e a irmã do senador Aécio Neves (PSDB/MG), atualmente presa, vários veículos criticaram o grampo (autorizado judicialmente) e sua divulgação pública.

Neste link, a edição de 24/5 do Jornal Nacional, que criticou a divulgação dos áudios e demonstrou que nenhuma autoridade quer assumir a responsabilidade pelo ocorrido.
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PS: Como dizia o saudoso Renato Russo, "ninguém respeita a Constituição".

Que país é esse? (Legião Urbana)

domingo, 12 de março de 2017

Folha perde a linha em matéria sobre TSE e não questiona o que realmente importa

A Folha de S.Paulo de 12/3 teve uma boa ideia: fazer uma reportagem sobre o ministro Herman Benjamin (foto), do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), relator da ação movida pelo PSDB contra a chapa Dilma-Temer, relativa às eleições de 2014.

Foto: Arquivo TSE
Mas errou completamente no destaque, ao publicar a manchete da matéria como "Rigoroso e homossexual assumido, Herman Benjamin quer fazer história no TSE". Não existe qualquer justificativa para tal referência!

Acrescente-se que, até onde se tem conhecimento, o ministro Benjamin nunca foi ativista de direitos dos homossexuais, de modo que a reportagem deve ter pego os leitores da Folha de surpresa. Soou como revista de fofocas.

Muito mais importante é a revelação de que o relator pretende votar a famosa ação em breve, já que dois dos atuais ministros do TSE estão na iminência de terem seus mandatos encerrados e há "especulações de que Temer os substituirá por magistrados alinhados ao governo".

A Folha teria prestado um serviço muito melhor se tivesse se aprofundado nesse tópico. Os mandatos nos tribunais eleitorais são muito curtos em relação à duração das ações eleitorais. Não seria o caso de serem maiores? Ou de a Justiça Eleitoral ter quadro próprio de julgadores? Diversas questões poderiam ser abordadas e não foram. Quem perde é o jornalismo sério.
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Confira a reportagem comentada e observe que a matéria pegou tão mal que o jornal, no mesmo dia, alterou o título para "Rigoroso, ministro que julga Dilma e Temer quer chegar ao Supremo", mas manteve o título original no link http://www1.folha.uol.com.br/poder/2017/03/1865637-rigoroso-e-homossexual-assumido-herman-benjamin-quer-fazer-historia-no-tse.shtml

segunda-feira, 13 de fevereiro de 2017

Eduardo Cunha é um réu corajoso

Fale-se o que quiser de Eduardo Cunha (foto), o ex-todo poderoso de Brasília e atual frequentador da carceragem de Curitiba. Uma coisa é certa, ele parece não ter qualquer receio de seus algozes. Essa é a impressão transmitida no artigo "O juiz popular", publicado na Folha de S.Paulo de 9/2.

Ciente de que poucos presos - quase nenhum, a bem da verdade - no País têm acesso a um espaço tão nobre no jornal mais lido do País, Cunha não economizou nas palavras dirigidas ao juiz federal Sergio Moro, a quem acusou de transformar "a carceragem da Polícia Federal em um hotel da delação".

"O juiz, para justificar sua decisão, vale-se da expressão 'garantia da ordem pública', sem fundamento para dar curso de legalidade ao ato ilegal. Isso, afinal, tornou-se mero detalhe em Curitiba, já que basta prender para tornar o fato ilegal em consumado" - Eduardo Cunha

Cunha ainda propõe seis medidas legislativas para garantia de direitos de acusados, tais como definição do que seja garantia da ordem pública e estabelecimento de prazo máximo para prisões preventivas. Curiosamente, não nos recordamos que o ex-deputado tivesse preocupação com tais temas enquanto ocupava uma cadeira na Câmara Federal.

terça-feira, 7 de fevereiro de 2017

O assunto é Alexandre de Moraes

Escolhido ontem (6/2) pelo presidente Michel Temer como seu indicado à vaga aberta no Supremo Tribunal Federal, o atual ministro da Justiça Alexandre de Moraes (foto) é o assunto do momento na imprensa.

Para Dimitri Dimoulis, na Folha de S.Paulo, a escolha "só possui semelhança com a de Nelson Jobim em 1997". No mesmo jornal, Hélio Schwartsman entende que o governo Temer "regrediu à média".

Joaquim Falcão, em sua coluna no Blog do Noblat (Globo), afirmou que Moraes "sempre foi o candidato do coração de Michel Temer".

O Estado de S.Paulo também dedicou várias análises a Moraes, a quem classificou de "jurista reconhecido, político controverso". Para José Nêumanne, a questão é de "Justiça ou parceria".

De todas, a melhor reportagem, por envolver um bom trabalho de pesquisa foi publicada pelo Estadão em 6/2: "Tese de Moraes impediria sua nomeação ao STF", de Luiz Maklouf Carvalho.

Agora, é aguardar a aprovação pelo Senado e posse no cargo. O indicado, professor de direito constitucional da USP, não deverá enfrentar dificuldades.

domingo, 5 de fevereiro de 2017

Jota publica texto imperdível sobre o Supremo

É da autoria de Joaquim Falcão e Diego Werneck Arguelhes o artigo "Onze Supremos: todos contra o plenário", publicado no Jota em 1º/2. A análise - profunda - compara-se ao perfil traçado por Luiz Maklouf Carvalho para a revista Piauí no ano de 2010.

O artigo vale ser lido e relido para que se possa compreender melhor o funcionamento de nossa Suprema Corte. Os autores falam das decisões e das "não-decisões" do tribunal e de como cada ministro pode atuar individualmente, escapando do controle do Plenário e até mesmo indo "contra o colegiado".

"Não basta entender o que o tribunal fez. É preciso analisar o que deixou de fazer – e deveria ter feito. O Supremo é o resultado de sua ação e omissão, presença e ausência".

Algumas das principais decisões de 2016 são analisadas no texto e, com base nelas, os dois professores da FGV Direito/RJ concluíram que cada ministro pode - em maior ou menor grau - evitar, emparedar ou contrariar as orientações do Plenário.

Melhor do que revelarmos mais, é conferir o artigo original. Boa leitura!
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* As reportagens da revista Piauí podem ser lidas em "Data venia, o Supremo" e em "O Supremo: quosque tandem".

terça-feira, 31 de janeiro de 2017

O Ministério Público vale o quanto custa?

Nas últimas semanas, algumas publicações questionaram os gastos dos diferentes ramos do Ministério Público (MP) brasileiro. Em reportagem* sobre o possível terceiro mandato de Rodrigo Janot (foto) à frente da Procuradoria-Geral da República (PGR), a Carta Capital de 25/1 trouxe alguns dados: R$ 16 bilhões de verba anual, equivalente a 0,32% do PIB brasileiro, R$ 6 bilhões destinados apenas ao Ministério Público da União em 2017 e quase R$ 29 mil o salário inicial de um procurador da República.


Em 28/1, o site Jota apurou que, somente com o famigerado auxílio-moradia, a PGR gastou, em 2016, mais de R$ 53 milhões. Um aumento brutal em relação a 2014, quando o gasto foi de R$ 23 milhões. O mesmo auxílio-moradia que todos os magistrados brasileiros recebem graças a decisão liminar do ministro Luiz Fux, do Supremo Tribunal Federal (STF).

No que toca ao MP, a Associação Nacional dos Servidores do Ministério Público questionou no STF a resolução do Conselho Nacional do Ministério Público que autoriza e regulamenta seu pagamento. Segundo o Estadão, a ação também está sob a relatoria de Fux.

Por fim, a Carta Capital publicou nova reportagem sobre o tema, classificando o Ministério Público brasileiro como "elitista e o mais caro do mundo". A revista cita dois estudos que embasariam sua conclusão: um da Universidade Federal do Paraná e outro da Universidade Cândido Mendes (RJ). Ambos podem ser lidos na íntegra na matéria.

O que pensa o leitor? Os gastos são justificáveis perante o importante papel do MP na sociedade ou há exageros?
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* Não localizamos link para a matéria "Janot e o 3º mandato", de André Barrocal.

sábado, 21 de janeiro de 2017

Brasil perde um de seus melhores juízes

Conheci o ministro Teori Zavascki muito antes dele assumir a relatoria da Operação Lava Jato no Supremo Tribunal Federal. Ele era ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ) nos anos em que lá trabalhei. Técnico, estudioso, eminente processualista, gentil no trato com as pessoas e respeitado por todos, possuía um atributo cada vez mais raro nos dias atuais: a discrição.

Crédito da foto: STJ
Embora fosse relator das ações criminais mais polêmicas em julgamento na mais alta corte do País, não se deixou seduzir pelos holofotes das câmeras de TV, não virou "salvador da pátria", não proferiu prejulgamentos de seus casos nas páginas dos jornais, nem foi retratado Brasil afora como Batman ou Superman. Zavascki atuava nos autos, com seriedade e sobriedade.

O amigo Rodrigo Haidar, jornalista que conhece o mundo jurídico como poucos, escreveu um belo texto sobre o ministro Teori no Consultor Jurídico.

Nesta outra reportagem do Consultor, um texto que destaca o perfil e a trajetória de Teori Zavascki e, no site do STJ, a repercussão entre os demais ministros daquela corte.

quarta-feira, 18 de janeiro de 2017

O que fazer com o "devedor ostentação"? Como cobrá-lo?

Cobrar uma dívida não costuma ser tarefa fácil no Brasil. No âmbito do processo civil, essa preocupação há anos atordoa o legislador, muito antes da aprovação do Código de Processo Civil (CPC) de 2015. Porém, mesmo com as mudanças legislativas, pouco se avançou em efetividade.

Uma das grandes polêmicas do novo CPC é a regra do artigo 139, inciso IV, que prescreve como poderes do juiz utilizar-se de "todas as medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou sub-rogatórias" para que se cumpra a ordem judicial, acrescentando expressamente: "inclusive nas ações que tenham por objeto prestação pecuniária".


Algumas reportagens têm destacado determinações judiciais como a retenção da carteira de habilitação (CNH) ou do passaporte de devedores, bem como o cancelamento de cartões de crédito. Outras - como a publicada no Estadão no domingo 15/1 - destacam o uso judicial de provas obtidas nas redes sociais, em especial no Facebook, como modo de se comprovar que o devedor possui bens para arcar com a obrigação. Em outras palavras, o chamado "devedor ostentação".

O tema foi destaque ontem no debate "Atipicidade dos meios executivos no novo CPC", no site Tudo do NCPC. Para quem não pôde acompanhar ao vivo, é possível conferir a íntegra no canal deles no YouTube.

terça-feira, 17 de janeiro de 2017

Novo site traz processo civil em pequenas pílulas diárias

O site Tudo do NCPC* é um projeto da editora Foco em parceria com cinco grandes amigos professores de processo civil: Fernanda Tartuce, Luiz Dellore, Zulmar Duarte, André Roque e Marcelo Machado.

Em curtos e informais vídeos diários - gravados normalmente fora de salas de aula ou de bibliotecas - os professores abordam as principais inovações do Código de Processo Civil (CPC) de 2015 e temas polêmicos, apresentando, de forma direta e sem rodeios, sua posição sobre o tema.

O material é gratuito e pode ser encontrado nas principais redes sociais (Youtube, Facebook, Twitter e Instagram), o que facilita o acesso aos interessados. Além dos vídeos, estão programados alguns eventos especiais: nesta terça-feira, 17/1, às 20h, ocorrerá um evento ao vivo onde se discutirá a atipicidade dos meios executivos no novo CPC. As inscrições são feitas diretamente no site.

Vale a pena acompanhar!
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* NCPC - Novo Código de Processo Civil.

quarta-feira, 4 de janeiro de 2017

Uber e direitos trabalhistas: um desafio internacional

Não há dúvidas de que o aplicativo de transportes Uber é um sucesso mundial. Tão logo inicia as atividades em uma nova cidade, a adesão de usuários - cansados dos normalmente caros e ineficientes táxis - é instantânea.

Caminhando lado a lado com o sucesso, estão as polêmicas. A mais conhecida, internacionalmente, é a revolta dos taxistas, seja pressionando autoridades a vetar o aplicativo, seja praticando lamentáveis atos de violência.

Outra questão tem sido objeto de intensos debates: os motoristas que aderem ao Uber têm direitos trabalhistas? São eles empregados ou meros colaboradores, que se associam por livre vontade ao serviço?

Recentemente, uma decisão do Reino Unido - ainda sem trânsito em julgado - reconheceu o vínculo empregatício entre o Uber e os motoristas. De acordo com reportagem do site Jota, também já existem ações trabalhistas ajuizadas no Brasil.

Nosso destaque vai para a bela e profunda reportagem "Excesso de horas, precariedade, baixos salários. A vida dos motoristas da Uber", da jornalista Sara Otto Coelho, para o portal Observador, de Portugal, publicada dia 2/1. Embora a situação não seja idêntica à do Brasil, vale a pena conhecer as dificuldades que enfrentam os motoristas que aderiram ao aplicativo.

terça-feira, 3 de janeiro de 2017

Trabalhista: Justiça francesa garante direito de "desligar"

Reportagem do jornal português Diário de Notícias de 2/1 repercutiu a entrada em vigor, na França, de nova lei que garante aos trabalhadores franceses o direito a se "desligar" das atividades do emprego em seus momentos de folga. Ou seja, não atender celular, responder e-mails ou mensagens de WhatsApp à noite e nos finais de semana.

A partir de agora, empresas e trabalhadores irão negociar "instrumentos de regulação das ferramentas digitais", de modo que seja respeitado o período de descanso. Além disso, serão feitas campanhas de sensibilização para o uso racional das ferramentas tecnológicas.

Interessante que o jornal português qualificou a nova lei como "inovação a nível mundial" e trouxe a opinião genérica de especialistas de que haveria dificuldade na implementação, seja por pressão dos chefes ou mesmo ambição pessoal. Contudo, não trouxe nenhum dado sobre a situação portuguesa relativa ao tema.
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Confira a íntegra da reportagem.

Para saber mais, recomendamos a leitura das matérias do jornal Público e do portal Observador (ambos portugueses).

segunda-feira, 2 de janeiro de 2017

Acúmulo de processos não é problema apenas no Brasil

O jornal argentino Página12 desta segunda-feira 2/1 traz um problema bem conhecido nosso: "Miles de causas acumuladas". A reportagem mostra a situação dos dez juízos trabalhistas de Rosário, uma das principais cidades argentinas, que, no cômputo global, encerraram 2016 com 22 mil novos processos e não conseguiram sentenciar nem 4 mil.

Manifestação de advogados em frente à Justiça Trabalhista
De acordo com a matéria, a situação começou a colapsar em 2011, ano em que houve um aumento de 40% nas ações trabalhistas* em comparação com o ano anterior. De lá para cá, foi criada uma única vara nova, que, obviamente, não conseguiu resolver o problema.

A ideia é que juízes, advogados e servidores unam-se em busca de soluções, na tentativa de se chegar a um consenso. Fala-se, por exemplo, na tentativa de conciliação prévia e na divisão entre juízes "de trâmite" e "de sentença", de modo a racionalizar o trabalho.
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* Na Argentina, a Justiça do Trabalho também é competente para julgar as ações de acidentes e doenças do trabalho.

A foto foi retirada do site SinMordaza e mostra uma manifestação de advogados contra o colapso na Justiça Trabalhista de Rosário (nov/2016).