quinta-feira, 5 de junho de 2008

Três visões sobre o julgamento das células-tronco

Na edição nº 74 do boletim Direito na Mídia, destacamos o término do julgamento da ação direta de inconstitucionalidade (ADI 3.510) ajuizada para que fossem proibidas as pesquisas com células-tronco embrionárias.

O placar oficial foi de 6 x 5 pela improcedência da ação, ou seja, pela constitucionalidade da Lei de Biossegurança, sem qualquer ressalva. Mas a imprensa repercute outras interpretações, como 8 x 3 pela improcedência (computando os votos dos ministros Gilmar Mendes e Cezar Peluso entre os vencedores) e até mesmo uma original interpretação de 11 x 0, sendo 6 votos totalmente favoráveis às pesquisas e 5 favoráveis com restrição.

Trazemos aos leitores do blog três diferentes visões sobre o julgamento. A do site Migalhas, que abordou com clareza as implicações da proclamação do resultado; a do Blog do Noblat (do jornalista Ricardo Noblat), sobre a confusão do placar; e a interpretação radical do jornalista Paulo Henrique Amorim, em seu site Conversa Afiada.

Para os fãs de julgamentos polêmicos, o ministro Marco Aurélio já anunciou que levará ao Plenário, no segundo semestre, a questão do aborto de fetos anencéfalos.
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Confira os textos:

- "Toda a humanidade perderia sem as pesquisas, diz Mendes" (Blog do Noblat, 29/5);

- "Células-tronco: anatomia do voto de Mendes" (Conversa Afiada, 30/5);

"Extrato do Julgamento
Os jornais anunciam o resultado como 6 a 5, o que literalmente se deu. No entanto, é preciso convir que outros ministros votaram também pela constitucionalidade das pesquisas, fazendo apenas algumas ressalvas. Neste sentido, por exemplo, foi o voto do ministro Peluso, que queria que se incluísse no extrato do julgamento uma ressalva da Corte (que na verdade era dele) de que houvesse a necessidade de fiscalização das pesquisas. Mas o ministro Celso de Mello, com mandato tácito de 6 dos ministros que votaram sem reservas, incisivamente protestou. Auxiliado pelo ministro Carlos Ayres Britto que lhe soprava as palavras que o calor do debate lhe roubava, o ministro Celso de Mello não aceitou a inclusão do ponto sugerido pelo ministro Peluso, e que de certa forma o colocaria entre os votos vencedores, tirando-lhe a eventual pecha dos que açodadamente conferirem o resultado do julgamento. Ademais, o ministro Celso de Mello observou que já há regulamentação da fiscalização das pesquisas e, ainda, isso nem foi objeto da ação. Seria, assim, uma decisão extra pedido. O ministro Peluso, por seu turno, justificou seu inflexível - e em uma vez agressivo - posicionamento (e ali, para nós, era hora de dar um passo atrás, e que em nada o diminuiria) justificou questionando: "e se eles mudarem a regulamentação ?". O ministro Eros Grau, percebendo o excessivo acaloramento do debate, e arvorado no papel de mais velho da turma, tentou contemporizar. O tatuiense Celso de Mello, todavia, redargüiu mostrando que o debate era salutar, e que os seis votos que indeferiam a ADIn sem nenhum adendo deveriam prevalecer na declaração do resultado, o que consequentemente faria com que os outros, até mesmo aqueles que entendiam constitucional a pesquisa, mas que faziam uma ressalva - mínima que fosse -, ficassem de certa forma vencidos. Foi o que se deu, e o ministro Peluso, mesmo tendo votado pela constitucionalidade da pesquisa, acabou colocado entre os cinco que, para o leigo, foi contra os seis que permitiram a pesquisa. Ao ministro Peluso fica o conforto de que nós, migalheiros (e hoje não somos poucos), sabemos que não foi bem assim. Enfim, entre mortos e feridos, salvaram-se todos. Até mesmo a ministra Camen Lúcia que, com bom humor, ressalvando não ser célula-tronco, reclamou da baixa temperatura do ar-condicionado do Plenário : "não sou célula-tronco, mas estou quase congelando". Era o fim do julgamento.

"E se..."
Sobre a tese do ministro Peluso, que queria incluir algo mais no voto, argumentando que "e se eles mudarem a regulamentação", convém lembrar a explicação que dava um saudoso professor de Direito Constitucional da velha Faculdade de Direito de Franca, quando o acadêmico - com sua inigualável criatividade - vinha com aquelas perguntas que começavam com o clássico "Professor, e se... ?". A resposta era fatal : "ora, meu senhor, em Direito - e o mestre também era um magistrado - esse 'e se' não dá certo". "Imagine o sr.", dizia ele todo respeitoso, "imagine o sr. se meu pai fosse mulher ?" "Nesse caso, eu teria duas mães?". Era o fim da aula." (Migalhas de 30/5).

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