sexta-feira, 28 de março de 2008

Cratera de Pinheiros: rocha é a culpada!

Deu no Jornal Nacional de ontem (27/3), já está nos sites e, nesta sexta-feira, estará nos principais jornais do país: o consórcio Via Amarela, responsável pela construção da linha 4 do metrô de São Paulo, anunciou que a culpa pelo acidente de 12 de janeiro de 2007 – que criou uma gigantesca cratera no local onde seria construída a futura estação Pinheiros e culminou na morte de sete pessoas – é de uma rocha! Uma rocha gigante, para ser mais preciso.

Nunca é demais divulgar – como fez a reportagem do UOL – que o mencionado consórcio é integrado pelas empresas OAS, CBPO (grupo Odebrecht), Queiroz Galvão, Camargo Corrêa e Andrade Gutierrez*. É que a imprensa, de um modo geral, costuma tratar o caso apenas se referindo ao consórcio, sem mencionar as empreiteiras responsáveis por sua formação.

A conclusão de que a culpa é da rocha e de que o desabamento foi uma “fatalidade” está em um laudo geológico encomendado pelo próprio consórcio e elaborado pelo engenheiro Nick Barton (britânico, segundo o UOL ou norueguês, de acordo com a Globo). A rocha teria 15 mil toneladas e não foi detectada pelas perfurações realizadas “por azar”. Para Márcio Pellegrini, diretor do consórcio: “Nada teria impedido o acidente. Todos os métodos conhecidos existentes teriam falhado.”

Na edição nº 21 de Direito na Mídia (23/1/07) comentávamos: “Merecem relevo também os debates sobre os culpados pelo desabamento e os responsáveis pelas indenizações, se o Estado, as empresas que integram o Consórcio Via Amarela ou São Pedro!”, deixando a seguinte pergunta em aberto: “quem responderá pelos enormes prejuízos que a cidade de São Paulo vem sofrendo, com seguidas interdições da Marginal do Rio Pinheiros e outras importantes vias urbanas?”.

Pelo laudo divulgado na noite de ontem, a questão permanece sem resposta.

Em tempo: numa rápida pesquisa na internet, somente o UOL relacionou as empreiteiras envolvidas na obra. Os sites G1 (Globo), Terra, Folha Online, Último Segundo (IG) e Estadão.com, além do próprio Jornal Nacional, apenas fazem referência ao consórcio Via Amarela. Como o consórcio sequer possui site, o nome das empresas praticamente não é atingido pelas notícias negativas da cratera do metrô paulistano.

* Há reportagens antigas que afirmam que a empresa Alstom também participa do consórcio. Como a Alstom fabrica trens, sistemas de sinalização e centros de controle operacional, acreditamos que ainda não estava atuando na época do desabamento.

quarta-feira, 26 de março de 2008

Justiça Federal lança revista

Ocorre nesta quinta-feira, 27/3, com as presenças dos ministros Raphael de Barros Monteiro, presidente do STJ e Gilson Dipp, coordenador-geral da Justiça Federal, o lançamento da revista Via Legal, produzida pelo Centro de Produção da Justiça Federal.

A revista – homônima do programa do Conselho da Justiça Federal (CJF) na TV Justiça – trará matérias sobre as principais decisões judiciais e administrativas proferidas pela Justiça Federal.

O Centro de Produção da Justiça Federal é formado pelas assessorias de comunicação dos cinco tribunais regionais federais e do próprio CJF.

Assim que tivermos a edição nº 1 em mãos, publicaremos aqui nossas impressões.

Indicação: revista Visão Jurídica

Indicado por um amigo jornalista, comprei a revista Visão Jurídica, numa banca do centro de São Paulo. Qual não foi minha surpresa ao descobrir que o periódico já está na 23ª edição!

Os destaques da atual edição são uma entrevista com o criminalista Antônio Cláudio Mariz de Oliveira e as reportagens "Como começar do zero" sobre recém-formados que planejam montar escritório próprio e "A indústria do dano moral".

A Visão Jurídica ainda não tem site, mas possui um blog http://revistavisaojuridica.blogspot.com. Indicamos, no blog, a leitura da entrevista com o ministro aposentado do STF e ex-juiz da Corte de Haia, Francisco Rezek.

"Já é criminosa a ocupação militar de território estrangeiro, a pretexto de defender direitos humanos de minorias, de restaurar a democracia ou, ainda, de procurar armas de destruição em massa que se sabe não existir. Agora, continuar com a ocupação, favorecendo uma guerra civil também é crime. Assim como montar tribunais e governos de fancaria." - Francisco Rezek (foto: site do Tribunal Superior Eleitoral)

terça-feira, 18 de março de 2008

Prisão civil do depositário infiel prestes a cair

Na última quarta-feira (12/3), em sessão plenária, o ministro Celso de Mello, do Supremo Tribunal Federal (STF) votou pela inconstitucionalidade da prisão civil do depositário infiel. Três casos estão sendo julgados, de forma conjunta, pelo STF: os recursos extraordinários RE 349.703 e RE 466.343 e o habeas corpus HC 87.585.

Entendeu o ministro Celso de Mello que os tratados sobre direitos humanos dos quais o Brasil seja signatário integram nosso ordenamento jurídico na qualidade de norma constitucional. Assim, votou pela concessão da ordem no HC e pela negativa de provimento aos recursos extraordinários, ambos interpostos por instituições financeiras (Itaú e Bradesco) visando a prisão dos devedores.

O ministro Carlos Alberto Menezes Direito pediu vista nas três ações.

A situação atual dos processos é a seguinte:

1. HC 87.585: dois votos pela concessão da ordem (2 x 0 pela impossibilidade de prisão);

2. RE 349.703: cinco votos negando provimento ao recurso, um não o conhecendo e dois pelo provimento (6 x 2 pela impossibilidade de prisão);

3. RE 466.343: oito votos pelo não provimento do recurso (8 x 0 pela impossibilidade de prisão).
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Confira a íntegra do voto do ministro Celso de Mello no HC 87.585 (54 laudas em formato PDF).

Vale a leitura! (Edição nº 67)

– “Mato Grosso ‘divide’ com Justiça receita de tributos” – Reportagem da Folha de S.Paulo de 16/3 (reproduzida no Migalhas);

– “OAB diz que protocolo é ‘absurdo’” e “Governador não vê ilegalidade” – Reportagens do Diário de Cuiabá de 18/3, repercutindo a denúncia da Folha;

– “Juizado especial demora até 8 meses para marcar 1ª audiência” – Matéria de O Estado de S.Paulo de 17/3;

– “Gilmar Mendes contemporiza relação entre Poderes ao tomar posse no STF” – Reportagem do Valor Econômico de 13/3 (clipping do Ministério do Planejamento);

– “Fusões fazem escritórios de advocacia acelerar ritmo” – Matéria do DCI de 13/3 (clipping da AASP);

– “Tributos prevalecem nos casos de repercussão do Supremo” – Reportagem do DCI de 11/3 (reproduzida na Revista Contábil Fiscolegis).

segunda-feira, 17 de março de 2008

Indicação de blogs

Gostaria de indicar a leitura de dois blogs que conheci no último final de semana.

O primeiro é o blog do desembargador Wálter Maierovitch, colunista de Carta Capital e comentarista da rádio CBN. Maierovitch comenta assuntos dos mais diversos, ligados sobretudo ao Direito Internacional. A repressão chinesa no Tibete, a possível extradição do traficante Juan Carlos Abadia e a criminalização do usuário de maconha estão entre os temas recentemente abordados.

O outro é o blog do Fragale, do juiz do Trabalho Roberto Fragale Filho que, em curtas notas, debate assuntos jurídicos e ligados à educação (em especial cursos jurídicos), além de trazer links para diversos estudos estrangeiros.

O caso do juiz preso após sair em Caras

Ícone entre celebridades e candidatos(as) ao estrelato, a revista Caras (foto) já contribuiu com a Justiça argentina, sendo a responsável pela abertura de processo que culminou na prisão por seis anos do juiz Francisco Trovato.

Trovato deixou-se fotografar pela revista - em 1995 - "ao lado de um luxuoso guarda-roupas avaliado em US$ 19 mil". De acordo com reportagem do Valor Econômico da última sexta-feira (14/3), com base em tal foto, promotores de justiça obtiveram a prova de antiga denúncia de suborno para favorecimento de uma empresa de elevadores processada pela morte de uma criança. Desencadeada pela reportagem de Caras, a investigação descobriu outros bens frutos de suborno recebidos pelo magistrado argentino.

A matéria do Valor, na verdade, tem seu foco no economista argentino Jorge Fontevecchia, dono do grupo Perfil, que edita a Caras em seu país, no Brasil, no Chile, no Peru, em Angola e na Rússia. Em terras brasileiras, a revista é a terceira de maior circulação, com 250 mil exemplares/mês, atrás apenas de Veja e Época.

A editora publica também o jornal Perfil, de circulação apenas nos finais de semana. Crítico dos governos Kirchner, o periódico está processando o Estado argentino junto ao Tribunal Interamericano da Organização dos Estados Americanos (OEA), acusando-o de discriminação da publicidade oficial: "esta é a única empresa que não recebe publicidade oficial, zero de publicidade oficial", afirmou o empresário.
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Confira a interessante reportagem "Fontevecchia, o economista que fatura com a 'Caras'" (reproduzida no Portal da América Latina);

Conheça a versão eletrônica do jornal Perfil;

Não foi possível encontrar na internet vesão aberta para a segunda parte da reportagem do Valor, intitulada "Ricos, famosos e um juiz que foi parar na cadeia". Para conhecer mais sobre a história do juiz Francisco Trovato - que foi preso no Brasil, em abril de 1998, e expulso do país - indicamos a leitura da edição de 24/4/98 do jornal Hoy, de La Plata (texto original em espanhol).

domingo, 16 de março de 2008

Um ponto não discutido na greve da AGU

Como vai ficar a defesa da União, de suas autarquias e fundações e até mesmo dos beneficiários da defensoria pública quando os advogados públicos federais encerrarem a paralisação, que atingiu hoje dois meses?

Os membros das carreiras jurídicas da Advocacia-Geral da União (AGU) estão em greve por reajuste salarial desde 17 de janeiro deste ano. Traduzindo, estão de braços cruzados os advogados da União, procuradores federais (incluídos os do INSS), procuradores da Fazenda Nacional, defensores públicos da União e procuradores do Banco Central (esta última categoria, a confirmar. Não localizamos, porém, nenhuma reportagem que indique que os procuradores do BC não participem do movimento).

Do que apuramos, apesar de a greve ter sido considerada ilegal pelo ministro Ricardo Lewandowski, do Supremo Tribunal Federal (Rcl 5.798 - confira a íntegra da liminar), os processos em que atuam os advogados públicos federais estão parados.

Duas graves conseqüências foram levantadas pelo repórter Fernando Teixeira, do Valor Econômico. Diante da dificuldade - ou até mesmo impossibilidade - de obtenção de certidões negativas de débitos, empresas buscam o Judiciário para conseguir tais documentos, necessários para participação em licitações, tomada de empréstimos bancários e envio de dinheiro ao exterior, por exemplo. Ainda segundo o Valor, litigantes com ações transitadas em julgado não podem levantar seus depósitos em decorrência da não intimação da Fazenda Nacional.

Um ponto, todavia, não foi devidamente repercutido: quando a greve terminar, todas as ações hoje represadas devem retomar seu trâmite normal praticamente ao mesmo tempo. Conseguirão os grevistas dar conta de todas? O risco da perda de prazos ou, no mínimo, de atuações açodadas por parte dos advogados públicos vai aumentar significativamente, em especial levando-se em conta o elevado número de feitos envolvendo o INSS e a defensoria pública. É aguardar para ver.
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Confira a reportagem mencionada: "Certidões complicam cotidiano de empresas" (Valor Econômico de 11/3, reproduzida no site da Fiscolegis - Revista Contábil e Empresarial)

sexta-feira, 14 de março de 2008

Humor: receita de preparo de uma polêmica

- Passo 1: escolha um assunto que as pessoas gostem de discutir. Podem ser as "espiadinhas" do Big Brother Brasil ou o novo affair da celebridade da última novela das oito. No nosso exemplo, vamos selecionar o seguinte: remuneração. Afinal, todo mundo gosta de falar do salário dos outros.

- Passo 2: para dar gosto, acrescente um elemento especificador. Por exemplo, falemos sobre salário de servidores públicos, que está para o paladar do brasileiro, assim como feijoada com caipirinha aos sábados.

- Passo 3: adicione uma pitada de tempero picante. Por que não falar sobre os servidores mais bem remunerados? A repercussão será maior.

- Passo 4: bata tudo no liquidificador e, antes de levar ao forno, acrescente duas colheres (das de sopa) de algum ingrediente que dê liga à mistura. O chef recomenda a utilização das chamadas diárias. Como na iniciativa privada praticamente ninguém aufere diárias, explique no que consistem.

- Passo 5: ao servir, tempere com exemplos concretos de beneficiários que recebem as diárias sem motivo para tanto. Caso não seja possível, deixe subentendido na reportagem que, mesmo que o pagamento seja legal, haveria algo de errado.

- Passo final: agora é só servir e bon appétit. Confira o resultado: "Diárias permitem que juiz de SP ganhe mais que no STF"

- Sobremesa: uma boa refeição só está completa com uma sobremesa caprichada. Para o gran finale, uma entrevista com alguma autoridade para justificar o que o teor da reportagem tentou demonstrar ser injustificável: "Pagamento está na lei, diz procurador-geral"
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PS 1 - Apesar de termos tratado o tema com ironia, para descontrair o final de semana, as matérias acima, da jornalista Lilian Christofoletti, publicadas na Folha de S.Paulo de 9/3, são sérias, bem escritas e possuem indiscutível relevância jornalística. Poderiam, é certo, constar de qualquer edição do jornal, deste, do próximo, ou de dois, três anos atrás.

PS 2 - Não consegui localizar na internet versões abertas das reportagens menciondas. Assim, não serão disponibilizados aqui os links. Assinantes da Folha ou do UOL podem localizá-las nas edições anteriores do matutino.

terça-feira, 11 de março de 2008

Vale a leitura! (Edição nº 66)

– “Justiça alivia a condenação de bancos” – Reportagem do DCI de 10/3 (clipping da AASP);

– “Morosidade mórbida – É difícil dizer ao cliente que ação vai levar oito anos” – Entrevista com Márcio Kayatt, presidente da AASP, no Consultor Jurídico de 9/3;

– “Ministério Público não é tucano, diz procurador-geral” – Entrevista com Rodrigo Pinho, procurador-geral de Justiça de SP, na Folha de S.Paulo de 9/3 (reproduzido na Rede Pró-Brasil);

– “Se Camões voltasse” – Crônica de Walter Ceneviva, para quem “se o voto de Ayres Britto fosse um poema épico, Camões voltaria para cumprimentar seu sucessor”, na Folha de 8/3 (clipping do Partido Democratas);

– “MEC vai investigar curso que aprovou garoto” – Reportagem da Folha de S.Paulo de 7/3 (clipping da PUC-Campinas);

– “Ministro do Supremo defende legalização do ‘aborto seguro’” – Reportagem do Valor Econômico de 7/3 (clipping da AASP);

– “Brasil teve 409 mil grampos a pedido da Justiça em 2007” – Matéria da Agência Câmara de 6/3.

Projeto cria "quase-advogados"

É de autoria do deputado federal Walter Brito Neto (PRB-PB) o Projeto de Lei 2.567/2007, pelo qual bacharéis não aprovados no Exame da Ordem dos Advogados poderão atuar perante os Juizados Especiais Cíveis e Criminais.

A exigência de aprovação no exame é "exagerada no caso dos juizados", afirmou o deputado paraibano, para quem a medida não ocasionaria graves prejuízos para a ordem jurídica e serviria de "treino" para os futuros advogados.

O projeto será analisado pela Comissão de Constituição e Justiça da Câmara. As informações são da Agência Câmara.

Divulgamos, em 25 de fevereiro passado, projeto de lei do deputado Jair Bolsonaro que vai além, propondo o fim do Exame da Ordem. Ao que tudo indica, como o número de aprovações na OAB é sempre muito menor que o total de reprovados, os parlamentares devem ver no tema uma chance de conseguir um eleitorado cativo.

PS - Acabo de conferir, no site da Câmara, que o jovem autor do projeto de lei em questão possui segundo grau completo e cursa Direito e Administração.

segunda-feira, 10 de março de 2008

Confusão na OAB-DF (*)

O jornal Correio Braziliense deste domingo (9/3) dá grande destaque ao que nomeou de "rede de intrigas" na seccional brasiliense da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-DF).

A história tem ingredientes "apimentados" e envolve, além de personagens da própria OAB-DF (a atual presidente, o vice afastado no final de 2007, três oposicionistas derrotados nas duas últimas eleições, examinadores do Exame da Ordem e uma funcionária graduada da entidade), o Ministério Público Federal (MPF) e as Polícias Civil e Federal (PF).

De acordo com o Correio, tudo começou quando a PF e o MPF começaram a investigar fraudes no Exame da Ordem no DF, inclusive com entrega de provas em branco que posteriormente apareceram preenchidas; investigações internas da OAB-DF também constataram falhas e integrantes da Comissão de Exame - incluído o vice-presidente da seccional - foram afastados. Nove examinadores e 137 candidatos aprovados desde 2004 responderão a processos administrativos.

A funcionária afastada por conta das denúncias teria sido procurada - ou "perseguida", como frisa o matutino - pelos advogados que fazem oposição à atual gestão para que acusasse seu ex-chefe e a presidente da seccional, Estefânia Viveiros, em troca de pedido de perdão judicial ao Ministério Público. Sentindo-se amaçada, a funcionária procurou a Polícia Civil, que gravou (áudio e imagens) dois encontros dela com os advogados...

No site do Correio Braziliense, somente está liberada para não assinantes a primeira parte da extensa reportagem: "PF investiga rede de intrigas na OAB-DF".

O Centro de Mídia Independente (CMI-Brasil) publicou a reportagem na íntegra, embora com uma formatação que deixe muito a desejar e dificulte um pouco a leitura. Quem quiser conferir, basta clicar aqui (para ler a reportagem indicada, baixe a tela até onde está escrito "O NOVO CAPÍTULO, DE 09.03.08).

Procuraremos, durante a semana, disponibilizar outros links para a matéria completa.
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* Atualização de 11/3 às 16h:

O site Migalhas publicou a íntegra da reportagem acima, acrescida do complemento publicado no Correio Braziliense na edição de segunda-feira, dia 10/3. Para ler, clique aqui. A formatação é bem mais agradável que a do CMI-Brasil.

quinta-feira, 6 de março de 2008

Parte final: O pedido de vista e os bastidores

O boletim Direito na Mídia havia previsto, na última edição, que ontem seria apenas o início do julgamento, por serem freqüentes os pedidos de vista em temas tão sensíveis. Alguns jornais já divulgavam, na quarta-feira pela manhã, a opinião do ministro Marco Aurélio, para quem era provável que seu colega, o ministro Carlos Alberto Menezes Direito, pedisse vista . A previsão se concretizou. Justificando que “o dever da Suprema Corte de um país, quando tem de julgar temas dessa natureza, é fazer uma reflexão profunda, com tempo, com análise dos autos, para que possam ser sopesados todos os argumentos que foram apresentados, incluída a audiência pública que foi realizada”, o ministro Menezes Direito (foto de José Cruz, Agência Brasil) pediu vista dos autos.

A presidente, ministra Ellen Gracie, adiantou seu voto, destacando que a ADI foi interposta há três anos e que, mesmo não havendo medida cautelar deferida, as pesquisas científicas, desde então, ou foram paralisadas ou sofreram grande desestímulo. Lembrou ainda da existência de nada menos que 565 processos na fila para julgamento do Pleno e acompanhou o voto do relator.

Para a presidente, o Supremo “não é uma academia de ciências” e prosseguiu: “não há vício de inconstitucionalidade na lei, nem se lhe pode opor a garantia da dignidade da pessoa humana, nem a garantia da inviolabilidade da vida, pois o pré-embrião não acolhido no útero não se classifica como pessoa”.

Confira a íntegra do voto da ministra Ellen Gracie (arquivo em PDF).

A antecipação de voto da ministra Ellen levou o ministro Marco Aurélio a questionar se essa postura seria um indicativo de que a imprensa estaria correta e a ministra iria mesmo se aposentar ao término de seu mandato na Presidência do Supremo (abril de 2008). A presidente negou tal intuito, mas o que se apurou é que ela deve realmente sair do STF quando deixar a Presidência da Corte. Os jornais especulam que o destino será o Tribunal Internacional de Justiça, a Corte de Haia, na Holanda, mas Direito na Mídia ouviu ontem , de algumas fontes, que a ministra poderá ocupar um cargo diplomático no Velho Continente. A confirmar...

Parte 4: O voto do relator


(Ministro Carlos Ayres Britto, foto de José Cruz, Agência Brasil)

Após merecido intervalo, a sessão foi reiniciada, faltando cinco minutos para as 17h, com a leitura do voto do relator. O ministro Carlos Ayres Britto levou quase duas horas na leitura, alternando momentos mais cansativos de citações de cientistas com tiradas bem colocadas, que levaram à platéia a discretos risos. Iniciou lembrando os 5 milhões de brasileiros portadores de alguma doença degenerativa e os 10 a 15 milhões de diabéticos e afirmou que só podem ser consideradas pessoas as que sobrevivem ao parto, nos termos do art. 2º do Código Civil: “a vida humana vai do nascimento com vida até a morte”.

Para Britto, “a Constituição Federal não diz quando começa a vida e não dispõe sobre o ‘antes’. Ela só fala do indivíduo, pessoa, gente, o ser humano já nascido, os residentes no país e não residentes em útero materno ou em tubos de ensaio. A Constituição, sobre o início da vida, é de um silencia de morte”. Distinguiu as figuras do nascituro e do embrião: “nascituro é quem está a caminho do nascimento, o que está do lado de fora do ventre materno não é nascituro. Embrião, feto e pessoa são inconfundíveis”.

Enquanto Fonteles e Ives Gandra acompanhavam com indisfarçável incômodo, prosseguia o relator: “o zigoto, sozinho, não se transforma em pessoa, não chega à fase de nidação. O congelamento ofende a dignidade do embrião. Aliás, a lei não veicula autorização para retirar do corpo da mulher um embrião, mas sim dos que estão fora do corpo. São embriões que não saíram e nem vão ser introduzidos no corpo da mulher”.

Lembrou a frase do ministro Celso de Mello, de que a causa em julgamento é a mais importante da história do Supremo e questionou o destino dos embriões: “ficarão em prisão perpétua? Ou serão jogados no lixo?”. Concluiu seu voto julgando totalmente improcedente a ação: “A Lei de Biossegurança protege o embrião. O que a Constituição autorizou, a lei perfilhou e o que proibiu, idem. Não há cérebro, nem mesmo em formação” e reforçou a idéia inicial: “a vida humana está entre o nascimento com vida e a morte cerebral”.

Mesmo sem adiantar seu voto, o decano do Supremo, ministro Celso de Mello pediu a palavra para fazer um registro e definir como “antológico” o voto do relator, que fará parte dos anais da Suprema Corte e será sempre lembrado, “até pelas gerações futuras”, por representar “a aurora de um novo tempo de esperança”.

Confira a íntegra do voto do ministro Carlos Ayres Britto (arquivo em PDF).

Parte 3: As sustentações orais

Além do procurador-geral da República, se manifestaram como partes o advogado-geral da União e Leonardo Mundim, advogado do Congresso Nacional. Ambos defenderam a Lei de Biossegurança, aprovada por 96% dos senadores e 85% dos deputados federais e sancionada pelo Presidente Lula. As sustentações que mais chamaram a atenção dos presentes, contudo, foram as dos amicus curiae. Espectadores e ministros ouviram com especial atenção as argumentações dos grandes causídicos Ives Gandra Martins (pela Conferência Nacional dos Bispos do Brasil – CNBB), Oscar Vilhena Viera (pela Conectas) e Luís Roberto Barroso (pela Movitae e Anis).

Para Ives Gandra, a posição defendida pela CNBB não é só da Igreja, mas sim da sociedade, afastando qualquer disputa entre ciência e religião. “A Academia de Ciências do Vaticano tem 29 prêmios Nobel”, destacou e se posicionou pelas pesquisas somente com células-tronco adultas, que teriam pluripotencialidades semelhantes às embrionárias que, em dez anos de pesquisas, não apresentaram “nenhum resultado positivo”, enquanto já existiriam 73 terapias estudadas com as células adultas, “até mesmo cura de câncer”. Sobre o que fazer com os embriões congelados, Gandra indicou a adoção de tais embriões e criticou uma lei que pode ter sido criada só para solucionar o problema de clínicas de fertilização.

Toffoli, chefe da AGU, colocou que são dois valores constitucionais em jogo, sustentando que, embora não se possa dizer o momento certo de início da vida, o Código Civil define pessoa a partir do nascimento com vida e o Código Penal também dá tratamento muito diferenciado, ao prever pena mínima de seis anos para o homicídio simples e de três anos para o aborto provocado sem consentimento: “por que a diferença, se são duas vidas? A lei não trata o feto como pessoa humana, o que falar do embrião, que sequer feto é”. Argumentou, por fim, que as pessoas com dinheiro irão se tratar no exterior, enquanto os outros se socorrerão da Justiça, pedindo que o Estado pague para elas, fora do país, o tratamento que o Judiciário proibiu aqui.

Leonardo Mundim voltou sua atenção para o futuro, que deve ser escrito sobre três prismas: responsabilidade, estímulo às pesquisas científicas e esperança. Atacou também o argumento da falta de resultados das pesquisas: “não ter resultados ainda não é motivo para proibição (das pesquisas com embriões), mas sim de incentivo à comunidade científica”.

Foi durante a sustentação de Oscar Vilhena Vieira que as alguns críticos das pesquisas começaram a se mostrar mais tensos. “A questão não é definir o começo da vida – a Corte Suprema dos EUA desistiu de dizer quando ela começa – mas sim de saber se o embrião pode ser comparado a uma pessoa”. E comparou: “a Constituição Federal não fez nenhuma referência à vida antes do nascimento e não há afronta grave à Constituição, porque a lei aqui questionada busca a otimização da vida”.

Luís Roberto Barroso era o mais esperado da tarde. Iniciou defendendo a sociedade pluralista e a diversidade de pensamentos: “Deus nos livre do pensamento e da moral única” e justificou: “a lei é equilibrada e razoável, as pesquisas só serão feitas se os casais autorizarem, quem não quiser, não será obrigado”. A polêmica foi maior ao se posicionar por uma definição filosófica e não científica do momento de início da vida, não sem destacar que tal questionamento seria irrelevante para esta discussão, “porque o direito brasileiro só admite o uso de embriões inviáveis ou congelados há mais de três anos, que não representam vida em potencial”.

Sobre os embriões congelados, Barroso sustentou que mantê-los perenemente congelados até o descarte ou jogá-los fora em vez de utilizá-los para pesquisas não seria ético: “se a ação for julgada procedente, as pesquisas serão cessadas, mas os embriões já existentes ficarão no mesmo lugar”. E finalizou: “todas as entidades científicas relevantes apóiam as pesquisas, a imprensa idem, inclusive em editoriais, e 75% da opinião pública é favorável. O Supremo não é um tribunal para si mesmo, ele faz interlocuções com a sociedade. Se a dúvida quanto à constitucionalidade for razoável, a decisão tem que ser favorável à lei”.

Parte 2: Expectativas e primeira surpresa

Já dentro do salão, algumas observações interessantes. Depois da divulgação do famoso chat entre ministros da Corte no julgamento da denúncia do mensalão, os fotógrafos foram impedidos de circular pelo Plenário. Agora, ficam todos num tablado atrás de quatro fileiras de cadeiras, o suficiente para boas imagens dos ministros, mas não para bisbilhotar. Os cinegrafistas então, nem isso. Somente a TV Justiça teve autorização para filmar a sessão, liberando as imagens às demais emissoras.

Às 14h todas as partes já se encontravam em seus devidos lugares na primeira fileira, com exceção do advogado-geral da União, ministro José Antonio Dias Toffoli, que só adentrou no Plenário às 14h15, juntamente com os ministros da Casa. Também na primeira fileira, o ex-procurador-geral da República, Cláudio Fonteles, autor da ação. Logo de início, um aviso claro e objetivo da presidente Ellen Gracie: a Suprema Corte não admitiria manifestações da platéia em nenhum sentido. Foi então passada a palavra ao relator, ministro Carlos Ayres Britto que, em aproximadamente 20 minutos traçou o histórico da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 3.510, que pretende a revogação do art. 5º da Lei de Biossegurança (Lei 11.105/2005).

Enquanto o atual procurador-geral Antonio Fernando de Souza defendia a procedência da ação, explicando que discussões sobre o exato momento do início da vida acompanham toda história da humanidade e sustentando que a proteção constitucional à vida não se limita à interpretação restritiva do direito privado (início com o nascimento com vida), a primeira surpresa da tarde: discretamente, o ministro Joaquim Barbosa se ausentou do Plenário e não mais retornou. De acordo com alguns colegas da imprensa, ele tem sofrido de dores na coluna, o que lhe dificulta permanecer na mesma posição por longo período. Como o ministro esteve presente durante a leitura do relatório, registre-se, poderá votar neste processo.

Antonio Fernando de Souza ainda lembrou das controvérsias jurídicas e éticas em diversos países e rechaçou – sem citar nomes – a posição externada pelo ministro da Saúde José Gomes Temporão, de que a proibição das pesquisas com células-tronco embrionárias colocaria o país numa era de obscurantismo. Defendeu, por fim, a utilização de células-tronco adultas e das localizadas no líquido amniótico e na placenta.

Parte 1: Junto com os estudantes


(foto: José Cruz, da Agência Brasil)

Não é fácil assistir a uma sessão de repercussão nacional no Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF). O auditório do prédio, construído há décadas, possui apenas 250 lugares que, embora sejam mais que suficientes para as sessões normais, não comportam todos os interessados em acompanhar julgamentos históricos, como o que se iniciou ontem.

É certo que a atenciosa e eficiente equipe da assessoria de imprensa do STF ofereceu a este blog um lugar na sala de imprensa, localizada no 1º andar, com telão e computadores de uso livre. Mas, ao contrário dos outros tribunais, assistir a uma sessão no Pleno do STF é uma experiência única, pois a platéia fica muito próxima das partes e mesmo dos ministros, sendo possível visualizar até mesmo seus semblantes.

Assim, a saída foi chegar à Praça dos Três Poderes às 12h15, duas horas antes do início da sessão. Quando cheguei, aproximadamente uns 30 estudantes de Direito das faculdades de Brasília já estavam lá, orientados por seus professores da importância do julgamento. A fila cresceu num ritmo constante e, às 13h30, horário de abertura dos portões, já havia gente suficiente para lotar o salão. Advogados, estudantes, muitos jornalistas e ativistas favoráveis às pesquisas, que distribuíam gérberas laranjas e amarelas, símbolo da campanha (ao lado, imagem da campanha do Correio Braziliense).

Como visto na foto que abre este primeira parte (marcada com uma seta), a estratégia – embora cansativa – deu certo. Consegui lugar na segunda fileira, de frente para o Plenário, logo atrás das cadeiras reservadas para os advogados das partes e representantes da CNBB e de ONGs interessadas no julgamento, chamadas tecnicamente de amicus curiae (amigos da Corte).

terça-feira, 4 de março de 2008

Vale a leitura! (Edição nº 65)

– “A decisão só pode ser uma” – Editorial de O Estado de S.Paulo de hoje (4/3), sobre as pesquisas com células-tronco;

– “Advogados evitam apelo religioso no caso de pesquisa com embriões” – Reportagem d’O Estado de S.Paulo de 4/3;

– “A favor da ciência” – Editorial da Folha de S.Paulo de 2/3, também sobre as células-tronco (retirado do Jornal da Ciência da SBPC);

– “Ingrid Betancourt e os outros reféns” – Coluna do jornalista Mauro Santayana, no Jornal do Brasil de 29/2;

– “A Lei de Imprensa, ora a Lei de Imprensa” – Artigo de Carlos Brickmann, no Observatório da Imprensa de 26/2;

– “Jornalismo capivara e o velório das ossadas” – Artigo do repórter especial do Consultor Jurídico Cladio Julio Tognolli, no Observatório da Imprensa (26/2);

– Confira as três listas sêxtuplas enviadas pela OAB-SP ao TJ/SP para preenchimento das vagas do quinto constitucional.